Águas pluviais: dimensionamento de calhas

Aposto que você já se perguntou por que, em épocas de muita chuva, os telhados costumam dar tanto problema, como é o caso das famosas goteiras, os desagradáveis mofos no forro e até os desabamentos da cobertura!

Mas você sabia que uma das principais causas disso é o incorreto dimensionamento das instalações de águas pluviais?

Pois bem, nesse post você aprenderá como evitar esses problemas, fazendo o correto dimensionamento e execução de calhas e condutores e ainda seguindo as recomendações da ABNT NBR 10844/1989 – Instalações prediais de águas pluviais.

Agora vamos lá, engenheiros?

Conceitos básicos

Para iniciarmos nosso estudo, precisamos conhecer alguns conceitos fundamentais relacionados às instalações de águas pluviais, são eles:

Altura pluviométrica: Volume de água precipitada por unidade de área horizontal.

Intensidade pluviométrica: Razão entre a altura pluviométrica precipitada e seu respectivo intervalo de tempo.

Tempo de concentração: Intervalo de tempo decorrido entre o início da chuva e o momento em que toda a área de contribuição passa a contribuir para determinada seção transversal de um condutor ou calha.

Banner do curso de águas pluviais

Período de retorno: Número médio de anos em que, para a mesma duração de precipitação, uma determinada intensidade pluviométrica é igualada ou ultrapassada apenas uma vez.

Se quiser saber mais sobre período de retorno, temos um vídeo específico! Confira abaixo:

Área de contribuição: Soma das áreas superficiais que recebem e conduzem as águas para determinado ponto da instalação.

Área de contribuição de um telhado de duas águas.
Área de contribuição de um telhado de duas águas

Diâmetro nominal: Simples número que serve para classificar, em dimensões, os elementos de tubulações e que corresponde aproximadamente ao diâmetro interno da tubulação em milímetros, não servindo para fins de cálculos.

Perímetro molhado: Linha que limita a seção molhada junto às paredes e ao fundo do condutor ou calha.

Área molhada: Área útil de escoamento em uma seção transversal de um condutor ou calha.

Raio hidráulico: Razão entre a área molhada e o perímetro molhado.

Perímetro molhado (amarelo) e seção molhada (azul) de uma calha retangular.
Perímetro molhado (amarelo) e área molhada (azul) de uma calha retangular

Vazão de projeto: Vazão de referência para o dimensionamento de condutores e calhas.

Bordo livre: Prolongamento vertical da calha, cuja função é evitar transbordamento.

Caixa de areia: Caixa utilizada nos condutores horizontais destinados a recolher detritos por deposição.

Exemplo de uma caixa de areia de PVC.
Exemplo de uma caixa de areia de PVC

Calha: Canal que recolhe a água de coberturas, terraços e similares e a conduz a um ponto de destino.

Exemplo de calha colonial de aço galvanizado
Exemplo de calha colonial de aço galvanizado

Condutor: Canal ou tubulação destinado a recolher e conduzir águas pluviais até locais permitidos.

Saída: Orifício na calha, cobertura, terraço e similares, para onde as águas pluviais convergem.

Exemplo de uma saída de calha de aço galvanizado.
Exemplo de uma saída de calha de aço galvanizado

Ralo: Caixa dotada de grelha na parte superior, destinada a receber águas pluviais.

Exemplo de uma ralo linear de PVC.
Exemplo de uma ralo linear de PVC

Projeto de instalação predial de águas pluviais

Os passos seguintes foram elaborados para facilitar a execução de um projeto de instalação predial de águas pluviais, desde o cálculo da vazão de projeto para determinada localidade no território brasileiro até o correto dimensionamento e execução das tubulações, vejamos.

1 – Determinação da intensidade pluviométrica

No passo 1, para a determinação da intensidade pluviométrica (I) tomamos como base dados pluviométricos locais. Mas, para isso, devemos fixar a duração da precipitação (t) em 5 minutos e o período de retorno (T), que deve ser escolhido segundo as características da área a ser drenada, conforme abaixo:

  • T = 1 ano: áreas pavimentadas, onde empoçamentos possam ser tolerados;
  • T = 5 anos: coberturas e/ou terraços;
  • T = 25 anos: coberturas e áreas onde empoçamento ou extravasamento não possa ser tolerado.

Sabendo disso, temos os seguintes valores de intensidade pluviométrica para o território brasileiro:

Tabela 1 – Intensidade pluviométrica para tempo de duração de 5 min

Intensidade pluviométrica para tempo de duração de 5 min.

2 – Cálculo da área de contribuição

Neste passo, para o cálculo da área de contribuição para o posterior cálculo da vazão, devemos utilizar as expressões abaixo, conforme cada situação.

Vale ressaltar que, para construções até 100m² de área de projeção horizontal, salvo casos especiais, podemos adotar uma intensidade pluviométrica de 150mm/h.

Áreas de contribuição.
Áreas de contribuição

Se quiser saber com maiores detalhes como é feito o cálculo da área de contribuição, é só clicar no vídeo abaixo:

3 – Determinar a vazão de projeto

De posse das informações dos passos anteriores, a vazão de projeto pode ser calculada pela seguinte expressão:

\mathrm{Q=\dfrac{I.A}{60}}

Onde:

  • Q: Vazão de projeto (L/min);
  • I: intensidade pluviométrica (mm/h), tabela 1;
  • A: área de contribuição (m²).

Primeira aula do Curso de Instalações de Águas Pluviais

Tenha acesso agora a primeira aula do nosso curso de Instalações de Águas Pluviais



Capacidade de Carga em Estacas

4 – Dimensionamento

Neste passo, aprenderemos como dimensionar calhas e condutos a partir da equação de Manning ou por meio das tabelas e ábacos abaixo tomando como base a vazão de projeto já calculada.

Dimensionamento de calhas

Como dito anteriormente, calha é um canal que recolhe a água de coberturas e a conduz a um ponto de destino. Dessa forma, para que a água seja transportada corretamente, sem transbordamentos, é necessário um prévio dimensionamento da seção da calha, que deverá ser feito a partir da fórmula de Manning, indicada a seguir, e comparada com a vazão de projeto do passo anterior.

\mathrm{Q=K\cdot\dfrac{S}{n}\cdot(R_H)^{2/3}\cdot{i^{1/2}}}

Onde:

  • Q: vazão de projeto (L/min);
  • S: área da seção molhada (m²);
  • P: perímetro molhado (m);
  • R: raio hidráulico (m), R=S/P;
  • n: coeficiente de rugosidade, tabela 2;
  • i: declividade da calha (m/m);
  • K: 60.000.

Tabela 2 – Coeficientes de rugosidade

Material n
plástico, fibrocimento, aço, metais não ferrosos 0,011
ferro fundido, concreto alisado, alvenaria revestida 0,012
cerâmica, concreto não alisado 0,013
alvenaria de tijolos não revestida 0,015

Para facilitar o dimensionamento das calhas, a tabela 3 abaixo fornece as capacidades de calhas semicirculares, usando coeficiente de rugosidade de 0,011 para alguns valores de declividade. Para isso, os valores foram calculados utilizando a fórmula de Manning acima, com lâmina de água igual à metade do diâmetro interno.

Águas pluviais: Calha semicircular.
Calha semicircular

Neste caso, primeiramente fixamos uma declividade para a calha, então basta utilizarmos o valor de vazão encontrado no passo 2 e escolher, na tabela 3 abaixo, um valor maior ou igual a ele. Dessa forma, o resultado encontrado será o diâmetro para a calha circular. Viu como é fácil?

Tabela 3 – Capacidades de calhas semicirculares com coeficientes de rugosidade n = 0,011 (L/min)

Diâmetro interno (mm) Declividades
0,50% 1,00% 2,00%
100 130 183 256
125 236 333 466
150 384 541 757
200 829 1167 1634

Vele lembrar que alguma recomendações devem ser levadas em conta para o dimensionamento das calhas, são elas:

  • Inclinação uniforme mínima: 0,5%;
  • Quando a saída não estiver colocada em uma das extremidades: a vazão de projeto para o dimensionamento das calhas deve ser aquela correspondente à maior das áreas de contribuição;
  • Quando não se pode tolerar nenhum transbordamento ao longo da calha:  podem ser previstos extravasores como medida adicional de segurança;
  • Quando a saída estiver a menos de 4m de uma mudança de direção: a vazão de projeto para a calha deve ser multiplicada pelos coeficientes da tabela 4, abaixo.
Águas pluviais: Distância entre a saída e a mudança de direção.
Distância entre a saída e a mudança de direção

Tabela 4 – Coeficientes multiplicativos da vazão de projeto

Tipo de Curva Curva a menos de 2m da saída da calha Curva entre 2m e 4m da saída da calha
canto reto 1,2 1,1
canto arredondado 1,1 1,05

Dimensionamento de condutores verticais

Os condutores verticais são tubulações destinadas a recolher águas de calhas e similares e conduzi-las até a parte inferior do edifício. Para tanto, é necessário escolher quantos condutores deverão existir e isso depende do número de saídas necessárias para a calha.

Águas pluviais: Exemplo de condutor vertical (vermelho) e horizontal (azul).
Exemplo de condutores verticais (vermelho) e horizontais (azul)

Dessa forma, a vazão recebida por cada condutor vertical será simplesmente a vazão da calha dividida pelo número de saídas.

Diante disso, para a correta execução da instalação de águas pluviais devemos seguir algumas recomendações técnicas acerca dos condutores verticais, são elas:

  • Os condutores verticais devem ser projetados, sempre que possível, em uma só prumada;
  • Quando houver necessidade de desvio: devem ser usadas curvas de 90º de raio longo ou curvas de 45º e devem ser previstas peças de inspeção;
  • Diâmetro interno mínimo: 70mm.

Agora, para o dimensionamento dos condutores verticais, devemos utilizar os ábacos abaixo e observar os seguintes passos:

  • Primeiramente, devemos escolhes qual dos dois ábacos utilizar, para isso devemos escolher qual o tipo da saída da calha: aresta viva ou de funil;
  • Escolhido o ábaco, devemos levantar uma vertical a partir do valor da vazão calculada para o condutor vertical até interceptar as curvas de H (altura da lâmina de água na calha, em mm) e L (comprimento do condutor vertical, em m), correspondentes;
  • Após realizarmos as duas interseções, transportaremos a mais alta até o eixo D, por meio de uma linha horizontal;
  • Por fim, adotaremos o diâmetro nominal cujo diâmetro interno seja superior ou igual ao valor encontrado e maior que 70mm.

Tabela 5 –  Ábacos para a determinação de diâmetros de condutores verticaisÁguas pluviais: Ábacos para a determinação de diâmetros de condutores verticais.

Dimensionamento de condutores horizontais

Os condutores horizontais são similares às calhas. No entanto, a principal diferença é que esses dispositivos são responsáveis por receber as águas dos condutores verticais e conduzi-las a locais adequados, podendo possuir seção aberta ou fechada.

Abaixo, algumas recomendações técnicas acerca dos condutores horizontais:

  • Declividade uniforme mínima: 0,5%;
  • Dimensionamento dos condutores horizontais de seção circular: a altura da lâmina deve ser considerada igual a  2/3 do diâmetro interno do tubo;
  • Tubulações aparentes: inspeções sempre que houver conexões com outra tubulação, mudança de declividade, mudança de direção e ainda a cada trecho de 20m nos percursos retilíneos;
  • Tubulações enterradas: caixas de areia sempre que houver conexões com outra tubulação, mudança de declividade, mudança de direção e ainda a cada trecho de 20m nos percursos retilíneos;
  • Ligação entre os condutores verticais e horizontais: sempre feita por curva de raio longo, com inspeção ou caixa de areia.

Para o dimensionamento, basta utilizarmos a tabela 6 abaixo. Para isso, precisamos conhecer o coeficiente de rugosidade do material do condutor, fixar a declividade e saber o valor da vazão de água que deverá ser recebida por ele (geralmente o mesmo valor da vazão do condutor vertical). Por fim, basta apenas encontrarmos o valor correto dentre os diâmetros internos, na coluna 1.

Tabela 6 – Capacidade de condutores horizontais de seção circular (L/min.)

Águas pluviais: Capacidade de condutores horizontais de seção circular (L/min.).

Pois bem, esse foi nosso post sobre dimensionamento de calhas e condutores e nos baseamos, entre outras fontes, na ABNT NBR 10844/1989 – Instalações prediais de águas pluviais.

Caso deseje exercitar o que aprendeu agora, clique aqui e confira um simples exercício que preparamos.

E para mais informações, não contempladas neste post, assista o vídeo explicativo que o Guia fez especialmente pra você:

É isso pessoal, se gostou, não deixe de seguir a gente por qui e também no Youtube e se ficou qualquer dúvida, comente aqui embaixo!

26 comentários em “Águas pluviais: dimensionamento de calhas”

    • Dependendo da vazão, pode-se usar tubos de concreto com grandes diâmetros. A tabela serve apenas como referência para dimensionamento rápido com as bitolas mais usadas.

      Responder
  1. QUE ÓTIMO TRABALHO, TIROU TODAS AS MINHAS DUVIDAS, A CONSTRUÇÃO CIVIL PRECISA DE MAIS MULHERES IGUAL A VOCE, MUITO ATENCIOSA E SEGURA NO QUE FAZ, MEUS PARABÉNS!!!

    Responder
    • Boa tarde, Fábio, a inclinação da calha (sendo retangular ou não) é fixada pelo projetista, que deverá verificá-la através da Fórmula de Manning, lembrando que a recomendação é que ela não seja menor que 0,5%.

      Responder
  2. Olá! Excelente conteúdo. Porém fiquei com uma dúvida em relação a um ponto do ítem 4: “Quando a saída estiver a menos de 4m de uma mudança de direção, a vazão de projeto para a calha deve ser multiplicada pelos coeficientes da tabela 4”. Que mudança de direção seria esta?

    Responder
    • Olá, Gabriele, muito obrigada! Então, a mudança de direção da calha ocorre, por exemplo, quando ela acompanhar todo o perímetro do telhado, conforme exemplificado na imagem logo abaixo do enunciado. Ou seja, essa mudança de direção ocorre quando a calha não é retilínea.

      Responder

Deixe um comentário para Luh Cancelar resposta